por Renato Bernhoeft
Os estudos e pesquisas sobre as causas que permitem aumentar a longevidade das empresas familiares em todo o mundo possuem um ponto em comum: o registro, transmissão e preservação das suas histórias, cultura, valores e legado. Seja no Japão, com empresas que ultrapassaram um milênio; na Europa com famílias que mantém o controle de suas companhias por mais de 200 anos; nas inúmeras centenárias dos Estados Unidos; ou até mesmo na meia centena de casos brasileiros que ultrapassaram 100 anos. Em todas elas, é possível observar o mesmo fenômeno.
Vale o registro de que estamos nos referindo, exclusivamente, a empresas cujo controle permanece com as famílias fundadoras. O que torna esta amostragem muito mais digna de reconhecimento e méritos.
De maneira geral, a missão de garantir que o legado, em suas mais diversas formas, seja preservado e transmitido às gerações seguintes é atribuída ao Conselho de Família, órgão que tem como função principal preparar e educar as novas gerações. E não pensemos que é uma função secundária.
O Centro para o Mito e o Ritual na vida americana, da Universidade de Emory, pesquisou 40 famílias ao longo de dois anos, demonstrando o seguinte: “a noção das histórias da família - incluindo sucessos e fracassos - está muito ligada à autoestima das crianças e a capacidade das mesmas para enfrentar problemas ou desafios. E, ao contrário do que podem pensar muitos adultos, nem sempre as melhores histórias são, exclusivamente, aquelas que têm finais felizes”.
Segundo a mesma pesquisa “as crianças que compartilharam as histórias e o legado familiar, tendem a ganhar uma noção de identidade própria em relação a outros membros da família e ao passado, o que gera maior confiança”. E conclui que “...as famílias que compartilham suas histórias familiares conseguem que seus filhos se saiam melhor, tanto na vida pessoal como profissional”. Ao nos referirmos às famílias empresárias todo este conjunto de observações se torna ainda mais útil.
O compartilhamento da história de vida de um fundador, com todas as suas dúvidas, ousadias, determinação, altos e baixos não apenas merece ser contada, como também ser preservada para a transmissão às futuras gerações. Afinal “ninguém ama o que não conhece”. E, especialmente para boa parte dos herdeiros, ser filho de pai ou mãe brilhante pode se transformar em uma forte carga emocional. Ao saber que os pais também sofriam de incertezas e angústias, ele pode não apenas reduzir as pressões decorrentes da herança, mas criar entusiasmo na adoção de um sonho compartilhado.
O ditado popular “pai rico, filho nobre e neto pobre” tem como uma das causas principais o desconhecimento da terceira geração das vicissitudes enfrentadas pelo avô, na qualidade de empreendedor. O mesmo provérbio é complementado pela afirmativa de que “uma mãe mantém dez filhos...mas nem sempre dez filhos mantêm uma mãe”.
Ou seja, a herança por si só não assegura o padrão de vida dos herdeiros. Cada geração necessita agregar valor ao patrimônio recebido, isso porque “Dinheiro não aguenta desaforo”.
E recordando o que nos disse o historiador da Banca Sella, uma família empresária italiana, quando perguntado sobre as razões para que tivessem ultrapassado, juntos, 14 gerações: “Em nossa família existem mortos que estão vivos, mas também vivos que estão mortos”. E o que preocupa, de fato, são os vivos mortos...
Enfim, a constatação de todo este conjunto de provocações para a família empresária: não basta transferir a herança para os descendentes, mesmo que isto seja feito com todos os cuidados jurídicos e amarrações patrimoniais possíveis. Uma herança sem legado será rapidamente destruída. E não apenas o patrimônio, mas também as relações familiares, bem como a autoestima dos membros da família. Dedique tempo a transmissão da história para as futuras gerações. Esta é uma responsabilidade que não deve ser adiada e não pode ser delegada.
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